quarta-feira, 5 de maio de 2010

Durmam tranquilos os torturadores?

*Marcelo Zelic
O objetivo exposto pelo professor Comparato ao entrar com a ADPF-153 no Supremo Tribunal Federal, consistia em colocar um ponto final à dubiedade da extensão da Lei da Anistia, referente ao termo “crimes conexos” e esclarecer a situação jurídica, para fins de responsabilização, dos agentes públicos que sequestraram, torturaram, estupraram, assassinaram e promoveram o desaparecimento de corpos dos opositores da ditadura militar de 1964-1985, entrave que se arrasta há mais de trinta anos e que impossibilita a punição destes crimes de lesa humanidade praticados no Brasil, tornando clara a posição do estado brasileiro frente a questão da tortura e da impunidade.
A decisão que agora obtivemos sobre o pleito da OAB, tem o papel de dar efetividade para que os atingidos desta barbárie possam perseguir, de forma consequente, a realização da justiça em nosso país, pois uma vez afirmada a impunidade dos torturadores da ditadura militar pela maioria de nossa corte maior, abre-se o caminho trilhado por países como o Chile, que nos anos 70 e 80 viveram as mesmas barbaridades e vendo esgotados todos os meios jurídicos possíveis internamente, recorreram à Corte Interamericana de Direitos Humanos, para que os tratados firmados fossem respeitados, a auto-anistia anulada e a barbárie julgada. Só depois de uma condenação na OEA, os juízos chilenos começaram e se multiplicaram, promovendo a justiça aos crimes de lesa humanidade e a prisão de seus torturadores e assassinos.
A justiça mesmo que tardia haverá de alcançar estes algozes e a postura do estado brasileiro e da Corte Suprema do Brasil, já condenados ética e moralmente nos votos dos Ministros Ayres Brito e Lewandovisky, que desmontaram a farsa do voto do relator eros grau, sentirão que vivemos em uma outra época, em que acordos impostos para realização de auto-anistia, não se sustentam na jurisprudência internacional.
O estado brasileiro já irá responder na OEA, pelo caso dos desaparecidos no Araguaia, o caso de Valdimir Herzog já foi protocolado e outros como o do desaparecimento de Virgílio Gomes da Silva, que o Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo havia encaminhado ao Ministério Público Federal, para abertura de processo civel e criminal, em breve como tantos outros casos de vítimas da ditadura militar, começarão a ser apresentados perante os tribunais internacionais.
Aqueles que como os ministro gilmar mendes, eros grau, carmem lúcia, celso de mello, ellen gracie, marco aurélio e cezar pelluzo, que zelam pelo sono tranquilo dos torturadores e que hoje festejam a impunidade da barbárie, verão que longe de encerrar a questão, a posição do STF a colocou rumo a uma real concretização e realização de juízos contra estes torturadores.
Ressalto duas frases do Ministro Ayres Brito, “Não se pode ter condescendência com torturadores” e também “o perdão coletivo é falta de vergonha e de memória” e vergonha é a corte que temos, mas apesar de vocês, a justiça chegará ao Brasil.

*Marcelo Zelic
Vice-presidente do Grupo Tortura Nunca Mais-SP e membro da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo
Coordenador do Projeto Armazém Memória

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