sexta-feira, 14 de maio de 2010

Silencio da oposição poderá abançoar pecador debochado

Direto ao Ponto, de Augusto Nunes, na Veja Online:
Pelo conjunto da obra, Romeu Tuma Junior conseguiu transformar-se num personagem espantoso no país que já não se espanta com nada. Delegado de polícia, confessou-se incapaz de distinguir um mafioso de um coroinha. Para virar Secretário Nacional de Justiça, bastou-lhe a certidão de nascimento. Incumbido de combater a pirataria e a evasão de divisas, comprou produtos contrabandeados e tentou liberar o embarque de uma deputada com 160 mil dólares escondidos na bagagem.
Alojado no alto escalão do Ministério da Justiça, reduziu o gabinete a território fora-da-lei. Em setembro, ao saber da prisão do bandido de estimação Paulinho Li, apareceu sem convite na Polícia Federal para explicar que só conhece o Paulinho Li, não o mafioso Paulinho Li. Contou o que ocorrera ao ministro Tarso Genro. “Toca o pau”, animou-o o chefe solidário. Tocou o pau com tanta animação que, há menos de um mês, o novo ministro Luiz Paulo Barreto promoveu o subordinado a presidente do Conselho de Combate à Pirataria.
Apadrinhado por Lula, afagado por Tarso Genro, promovido por Barreto, é compreensível que tenha reagido às denúncias publicadas pelo Estadão com o cinismo agressivo que identificam os condenados à impunidade. “É um problema político”, disse quando confrontado com as provas colhidas pela Polícia Geral. As declarações seguintes comprovaram que, no faroeste tropical produzido pela Era Lula, xerifes podem virar bandidos, dispensar disfarces e debochar dos homens de bem sem o risco de perder a estrela no peito.
“Tirem o cavalo da chuva: não vou sair”, sugeriu aos interessados em confirmar se o governo pedira que se afastasse do cargo. O ministro Barreto recomendou educadamente que se licenciasse por um mês, para costurar algum álibi consistente. O subordinado aceitou entrar em férias e voltar em 10 dias, por que precisava “descansar um pouco”. Enfim convencido a prorrogar o descanso, zombou outra vez do ministro: “Vou pegar um sol e voltar moreninho”.
Se não há limites para a arrogância do meliante sem medo, tampouco existem fronteiras para a leniência do presidente sem pudores. Há uma semana, com a expressão compungida de seminarista que perdeu a fé, voz de mãe de preso entrevistada pela TV em dia de rebelião na cadeia, o Pregador dos Pecadores Companheiros aconselhou o país a esperar o fim das investigações. Informado de que as investigações sobre Tuma Junior nem começaram, explicou que não tem autoridade para abrir inquéritos. Informado de que lhe sobra autoridade para afastá-lo do cargo, louvou a “folha de serviços prestados ao país por um delegado muito respeitado”.
Lula deve ter incluído nessa folha de serviços a viagem do secretário nacional de Justiça a Pequim, onde baixou em fevereiro de 2009 para discutir com autoridades chinesas um “acordo de cooperação no combate ao crime organizado e à lavagem de dinheiro”. A viagem acaba de ser incorporada ao prontuário do servidor da pátria por outra descoberta divulgada pelo Estadão desta quinta-feira: o segundo representante brasileiro na incursão pelo Extremo Oriente foi Paulinho Li. Ele mesmo. Com diárias doadas pelo Ministério da Justiça.
Para o governo em avançado estágio de decomposição moral, Tuma Junior é só mais um na multidão. Se o Brasil ficasse repentinamente civilizado, e alguém gritasse “olha o rapa” no meio da plateia de um grande comício de Dilma Rousseff, todos no palanque sairiam em desabalada carreira. Por acreditar que princípios éticos não influenciam a decisão do eleitorado, Lula vive desempenhando o papel de comparsa com convicção e entusiasmo. Vê-lo associado a Tuma Junior não tem nada de espantoso. O que espanta é a mudez dos oposicionistas.
Em 31 de março, ao deixar o governo paulista para disputar a presidência, o candidato José Serra disse o que o Brasil que presta esperava ouvir há muito tempo: “Estou convencido de que o governo, assim como as pessoas, tem que ter honra. E assim falo não só porque aqui não se cultiva escândalos, malfeitos, roubalheira, mas também porque nunca incentivamos o silêncio da cumplicidade e da conivência com o malfeito”.
O caso protagonizado por Tuma Junior é um escândalo que envolve malfeitos e roubalheiras. O que espera Serra para mostrar-se fiel ao discurso e garantir que, se for o vitorioso, tais afrontas não serão toleradas? Ou a oposição condena sem rodeios o malfeitor ou terá optado pelo silêncio cúmplice. Pouco importa que o senador Romeu Tuma e o PTB inteiro repliquem com a adesão à candidatura de Dilma Rousseff. A opção correta vale qualquer custo. A honestidade não tem preço

Um comentário:

Unknown disse...

Elementar

Uma boa maneira de entender a fritura de Romeu Tuma Jr é recordar outras ações da Polícia Federal em época de eleições. Por exemplo, a que flagrou uma bolada no escritório de Roseana Sarney e a que surpreendeu a compra do dossiê petista que sugeria ligações de José Serra com a máfia das ambulâncias.
Há sempre um perfeito senso de oportunidade, que resulta conveniente para os planos de Serra. Por coincidência, mas por simples coincidência mesmo, como num passe de mágica, as investigações conseguem unir flagrantes constrangedores e pretensões eleitorais que envolvem o tucano de alguma forma.
A propósito, o senador Romeu Tuma (PTB-SP), candidato à reeleição, atrapalha os planos da coligação encabeçada pelo PSDB paulista. Articuladores ligados a Serra, Geraldo Alckmin e Orestes Quércia tentam dissuadir Tuma há meses, sem sucesso. Até agora.