E-mail de Cláudia Mousinho com artigo de Reinaldo Azevedo, da Veja Online:
O título parece nome de filme iraniano? Não deixa de ser. No caso, um filme de terror que se realiza lá e uma tragicomédia que se vive aqui. No Irã, a protagonista é Sakineh Mohammadi Ashtiani, acusada de adultério e condenada a morte por apedrejamento — já recebeu 99 chibatadas. No Brasil, o ator principal é Luiz Inácio Lula da Silva, capacho de ditaduras em que trogloditas de todo o mundo tentam limpar suas patas sujas de sangue em nome da autodeterminação dos povos. Há um movimento mundial em favor da libertação de Sakineh. Ao clamor mundial, Lula responde ora com estupidez, ora com chacota falsamente caridosa, que mal disfarça o endosso à tirania iraniana e, acreditem!, o apedrejamento simbólico da vítima. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é aprovado por quase 80% dos brasileiros? Estou me lixando pra isso. Revela-se, a cada dia, um monstro moral. Quando e se ele bater nos 100%, vocês me avisem: pretendo ser o traço estatístico a lhe dizer: “NÃO!!!”
Mesmo quando parece aquiescer com as noções básicas de justiça, Lula chafurda no pântano da justificação do mal, da impostura, da vilania ética e da ilegalidade. Este senhor, com efeito, é uma personagem inaugural: nunca antes na história destepaiz a estupidez foi tão bonachona, a burrice tão aclamada, a prepotência tão “autêntica”. Lula é a expressão do bom selvagem de Rousseau — uma formulação já originalmente cretina de um cretino “castelão e vagabundo” (by Fernando Pessoa) — filtrado pelo sindicalismo oportunista e pelo stalinismo do petismo casca-grossa.
No sábado, durante um comício em favor da candidatura de Dilma Rousseff à Presidência, o Babalorixá de Banânia resolveu oferecer a sua ajuda a Sakineh nestes termos:
“Se vale a minha amizade e o carinho que eu tenho pelo presidente do Irã e o povo iraniano, se essa mulher está causando incômodo, a receberíamos no Brasil de bom grado”.
Notem que a vítima aparece como aquela que “está causando incômodo”. Mahmoud Ahmadinejad, que manda enforcar opositores em praça pública, pendurados em guindastes, merece a “amizade” e o “carinho” de Lula. Mas isso ainda é pouco.
O presidente brasileiro não está se oferecendo para receber a iraniana condenada ao apedrejamento em nome da civilidade, dos direitos humanos ou mesmo da caridade. Ele se propõe a resolver um “incômodo” de seu amigo Ahmadinejad. Entende-se que a oferta busca honrar aquela “amizade” e aquele “carinho”. Não é que ele ache a pena, em si mesma, brutal ou injusta. Lula, em suma, justifica o mal.
A impiedade de sua oferta — e nisso está sua impostura — se revela na seqüência de sua fala, quando confessa, em seu português exótico, cujo sentido se presume, ter traído Marisa Letícia:
“Fico imaginando se um dia tivesse um país do mundo que se o homem trair fosse apedrejado. Eu queria saber quem é que ia gritar: ‘Atire a primeira pedra iá iá aquele que não traiu’”.
Ele cantarolou. Os presentes riram. Lula é a face risonha da morte. Lula é a versão galhofeira das tiranias. Lula é o clown da violência institucional. No fim das contas, oferece o Brasil como abrigo inferindo que esta é uma boa terra para adúlteros, não para vítimas de ditaduras. Bem, os boxeadores cubanos que o digam. Lula os jogou no colo de Fidel Castro. Tudo compatível com o pensador que comparou os protestos contra a fraude eleitoral no Irã a torcedores descontentes porque seu time perdeu o jogo. Lula atinge o grotesco quando cantarola “atire a primeira pedra” referindo-se justamente a a uma mulher condenada ao apedrejamento. Eis o vilão ético.
E, por espantoso que pareça, Lula também transgrediu abertamente a lei ao fazer, num palanque eleitoral, uma oferta que diz respeito ao que seria um ato de governo. Sua propensão à ilegalidade é incurável.
Mãos sujas
O Babalorixá já havia lavado as mãos nesse caso — sujando-as, como de hábito, no sangue de todas as ditaduras do planeta. Na quarta-feira, em solenidade no Itamaraty, explicou por que preferia não se envolver:
“Um presidente da República não pode ficar na internet atendendo todo o pedido que alguém pede de outro país. É preciso tomar muito cuidado porque as pessoas têm leis, as pessoas têm regras. Se começarem a desobedecer as leis deles para atender o pedido de presidentes, daqui a pouco vira uma avacalhação”.
Seria até ocioso, mas vale lembrar, uma vez mais, a título de registro histórico que este mesmo presidente foi a voz mais estridente contra os governos constitucionais de Honduras — tanto o provisório, que substituiu o golpista Manuel Zelaya, como o eleito (que o Brasil ainda não reconhece) —, ignorando, então, o fato de que aquele país “tem leis”. É claro que são situações incomparáveis: Zelaya foi deposto para que a democracia sobrevivesse em Honduras; a condenação de Sakineh é evidência de uma tirania. Lula é legalista nos regimes de força e porcamente legitimista nas democracias; naquelas, defende o império da lei que perpetua o mal; nestas, alinha-se com os transgressores, que as depredam em busca do mal.
E Dilma, a “mulher”?
A candidata petista Dilma Rousseff, a exemplo de seu chefe, é uma contumaz defensora do regime iraniano e de seu líder máximo, Ahmadinejad. Suas entrevistas estão espalhadas por aí. Dada a repercussão mundial do caso e considerando que Lula é um dos poucos “amigos” do facinoroso, resolveu se pronunciar a respeito. Segundo a candidata, a condenação “fere a nós, que temos sensibilidade, humanidade”.
É a expressão do pensamento afásico da criatura eleitoral de Lula. Uma ova, minha senhora! A condenação de Sakineh não é algo que ofende almas sensíveis. Trata-se de uma brutalidade que fere o que tem de ser considerado um padrão universal, sim, de civilização, que não pode ser seqüestrado pela canalha relativista — canalha esta tão mais propensa a reconhecer os “valores particulares” de cada país quanto mais esses valores se chocam com o Ocidente que adoram detestar. E só podem detestá-lo, diga-se, porque as prerrogativas democráticas que ele oferece lhes faculta a expressão de seu odioso pensamento. Eis aqui, leitores, um grande paradoxo: as democracias permitem até a manifestação do mal; as tiranias costumam proibir a expressão do bem. Lula e Dilma são amigos dos tiranos.
Lula, visto inicialmente como o príncipe augural, recebeu o beijo da prepotência e voltou a ser o sapo retrô, que vai deixando, mundo afora, um rastro asqueroso de justificação do mal. Ao contrário do que reza a propaganda oficial e até de certo senso comum, Lula manchou a reputação do Brasil num valor cada vez mais caro na relação entre os países: os direitos humanos. Confessando-se um adúltero — e supondo que todos o são —, este senhor ofereceu-se para receber uma “adúltera”, não uma vítima de um regime asqueroso. E assim procede porque, afinal de contas, suas relações com o tirano são de “amizade” e “carinho”.
É o mais baixo a que ele chegou até agora. Mas eu jamais corro o risco de subestimá-lo. Seu mandato não acabou. E, nesse particular, Lula pode mais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário