segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Melhor esquecer

De Ricardo Noblat, em O Globo, reproduzido pelo Boletim da CNA:
“A democracia é exatamente isto: cada um fala o que quer, escreve o que quer, e o povo faz o grande julgamento” (Lula)
Droga de campanha, esta. Fora do controle do seu marqueteiro, Dilma revelou-se incapaz de dissertar sobre qualquer coisa com começo, meio e fim. A racionalidade excessiva de Serra embotou todo tipo de emoção que ele pudesse transmitir. Marina arrancou lágrimas de empresários em pequenos auditórios, mas saiu-se mal nos debates de televisão.
Alguém sabe citar de cor as principais promessas feitas pelos candidatos? Lembrome das seis mil creches e das não sei quantas Unidades de Pronto Atendimento de Dilma; do salário mínimo de R$ 600 e do reajuste dos aposentados de Serra; e do “governar com os melhores” de Marina.
Em suma: promessas pontuais ou genéricas.
Um projeto para o país? Algo ambicioso, mas necessário para quem se preocupa com o futuro? Os candidatos ficaram devendo. Ou porque não têm projeto. Ou porque acham que projeto não atrai votos. Dilma fala em dar continuidade ao governo Lula.
Serra diz que o Brasil pode mais. Marina atesta: é possível crescer respeitando o meio ambiente.
Dilma mimetizou Lula de tal maneira que usou em várias ocasiões expressões que são dele. Deu com o rosto na porta quem imaginou que o governo de Lula foi de Lula.
Não foi. Foi de Lula e de Dilma, a se acreditar na propaganda bem cuidada da candidata.
Os dois governaram juntos o país nos últimos sete anos e poucos meses.
Serra mimetizou Serra de tal forma que deu a impressão de estar de volta a 2002 quando era ministro da Saúde.
Ou quando era candidato a presidente da República recém-saído do Ministério da Saúde. Marina não mimetizou ninguém. Apenas pareceu esquecida de que trocou o PT por outro partido.
Perderá feio no Acre porque lá ela ainda é PT.
E o confronto de ideias entre os candidatos? Não houve.
Dilma fugiu da maioria dos debates. E as regras dos debates impediram o confronto tão desejável. Votará em Dilma quem gostaria de votar em Lula e não se incomoda em lhe passar um cheque em branco. Em Serra, quem não vota em Lula e no PT de jeito nenhum. E em Marina, os sonhadores.
Na ausência de ideias e de debates, as pesquisas de intenção de voto pautaram o comportamento dos candidatos, ocuparam generoso espaço na mídia e serviram para animar discussões exacerbadas na internet. Os responsáveis pelos institutos de pesquisas ganharam uma importância que não tiveram em eleições anteriores.
Montenegro, do Ibope, previu a eleição de Serra com mais de um ano de antecedência.
Foi obrigado mais recentemente a pedir desculpas pelo seu erro. O sempre discreto
Marcos Coimbra, do Vox Populi, escreveu artigos semanais para jornais, revistas e blogs explicando por que Dilma deverá se eleger no primeiro turno.
É, de fato, o que por ora está escrito nas estrelas — a eleição de Dilma no próximo domingo.
José Roberto Toledo, analista de pesquisas do jornal “O Estado de S. Paulo”, observa que o contingente de eleitores indecisos está perto de se esgotar como fator de crescimento dos candidatos Serra e Marina.
Para que haja segundo turno, a estarem certas as pesquisas, é preciso que Serra e Marina tomem eleitores de Dilma. Não será uma tarefa fácil, adverte Toledo. Dilma tem algo como dez milhões de votos a mais do que Serra e Marina somados. Do último sábado até o dia da eleição, Serra e Marina teriam de subtrair de Dilma 625 mil votos por dia.
Só um fato devastador para a reputação de Lula poderia provocar uma migração de votos tão grande e tão rápida.
Mesmo assim, o PT receia a convergência de causas mais prosaicas — entre elas, uma abstenção elevada no Norte e Nordeste e a regra que só permite o voto dos que exibam o título de eleitor e outro documento de identificação.
É razoável a aflição do PT.
Faltam apenas seis dias para que Lula consiga por meio de Dilma o que não foi possível em 2002 e 2006 — a eleição no primeiro turno. Em seis dias tudo pode acontecer — inclusive nada. O mais provável é que nada aconteça.

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